BLOG DO BETO

terça-feira, 29 de outubro de 2013

Tenente, piloto, apaixonado, Nobre: conheça o líder do retorno do Verdão.


“A opinião pública não confia em vocês e desconfia de mim. Eu confio no meu taco, e confio muito em vocês. Minha dúvida é se vocês confiam em vocês. Precisamos de autoconfiança porque o respeito vem de dentro pra fora. Se estivermos unidos, iremos longe”.
Foi assim que Paulo de Almeida Nobre se apresentou aos jogadores do Palmeiras um dia depois de ser eleito presidente, em janeiro. “Ir longe” significava voltar ao lugar de origem: a primeira divisão. Objetivo alcançado sem grandes tempestades, no último sábado. O discurso veio da alma verde, do sangue verde, do coração verde.
O dirigente é tão fanático que até parece um político populista tentando agradar a seu eleitorado. Mas basta um passeio por sites de busca para constatar que as entrevistas de três, cinco, dez anos atrás tinham o mesmo tom ufanista. É natural.
Já o tom motivacional se explica pela trajetória de vida do segundo tenente Nobre. Voluntário na infantaria do exército, formado em Direito e líder quase absolutista do Palmeirinha, time que fundou aos sete anos de idade, o presidente teve de tratar com terapia a relação com o Palmeiras e sua cor.
– Sempre fui muito palmeirense, tratei com terapia para entender. Quando era moleque, tomava bronca porque dormia com uma camisa do Palmeiras quando estava com medo de alguma coisa. Ela me fazia sentir mais seguro. Também só ia à escola de roupa verde. Costumo dizer que o Palmeiras é um estilo de vida, quase uma religião.
Paulo Nobre recebeu o GloboEsporte.com em sua sala provisória na Academia de Futebol, enquanto a Arena não fica pronta. Sobre a mesa, uma infinidade de papéis e três celulares, dos quais só utiliza um. O outro é quase decorativo, e o rádio, para se comunicar com o segurança, vive sem bateria. Com botões da camisa abertos e dezenas de porcos – sua coleção tem mais de mil – sobre a estante, misturava alívio pelo acesso e preocupação com a situação financeira ainda calamitosa do clube.
O amor pelo Verdão guia a biografia deste homem de 45 anos, nascido no dia 24 de fevereiro de 1968 numa família de alta classe sem absolutamente nenhum palmeirense. O pai, Fernando, já tinha 60 anos quando Paulo veio ao mundo. Na era amadora, havia sido torcedor do Paulistano e fã de Friedenreich, mas foi contra a profissionalização do futebol.
– Ele achava que era um esporte de “gentlemen”.

Na Copa de 1974, o pai comprou uma televisão em cores, artigo raro na época, e os jogos em sua sala se tornaram eventos. O menino de seis anos gostava de brincar de futebol com um empregado santista. Era goleiro e, por causa da seleção brasileira, gritava “Leão” a cada defesa. Até o dia em que aguçou a curiosidade para saber onde jogava o ídolo platônico. Descobriu: Palmeiras.
Alfabetizado em domicílio por uma tia, professora, Paulo Nobre demorou a entrar na escola. Lá, seus melhores amigos eram palmeirenses. Um deles era Ricardo Signorini, hoje conselheiro do clube. Foi o pai dele, tio Jamil, quem o levou pela primeira vez ao estádio. Em 77, Paulo assistiu ao empate por 1 a 1 entre Palmeiras e Santos, no Pacaembu.
– Quando entrei, meus olhos brilharam, e pensei: é isso, isso é vida.
Tio Jamil criou um problemão para a família. Frequentar arquibancadas não estava entre os programas favoritos do pai e do irmão, 17 anos mais velho. Paulo encontrou, então, uma cúmplice em sua mãe Taïsa (com trema no i, homenagem do avô a uma personagem de Shakespeare). Em 1980, ela o levou a Porto Alegre de avião para um jogo decisivo contra o Internacional. O menino entrou em campo como mascote, ao lado dos ídolos. Em São Paulo, o pai acreditava que eles estavam apenas passeando pela Serra Gaúcha.
 
Presidente de dois clubes

Paulo Nobre se deu um presente de aniversário quando completou sete anos. Ao lado dos amigos palmeirenses da escola, entre eles Signorini, fundou o Palmeirinha. Um despretensioso time de crianças que marcava jogos contra outros garotos, e hoje tem estrutura invejável: gramado – no padrão Fifa, diz ele –, vestiários, alambrado... Tudo em sua chácara.
Um grande grupo de 30 pessoas se divide em times verde e branco para duelos semanais, às segundas-feiras. Há regras. A equipe aceita todos os torcedores, mas é terminantemente proibido usar qualquer peça de outro clube brasileiro.
Desde que foi eleito no Palmeiras, Paulo Nobre não foi a nenhum jogo, embora eles ainda aconteçam no “quintal” de sua casa. Um alívio para os comandados. Ele já passou por todas as posições, com destaque para a disciplina na zaga e a qualidade nas bolas paradas. Mas não devia ser fácil jogar a seu lado.
– Nunca permiti que o Palmeirinha tirasse onda. Se jogador do meu time metesse canetinha, chapeuzinho, ia para o banco. E não ia tomar banho, não. Ficaria vendo o jogo até o fim. Pode chegar ao vestiário e me quebrar de porrada, mas no campo não discute comigo. Se eu falei, engole. Prefiro que todos tenham raiva de mim, mas continuem unidos. Sempre fui muito disciplinador.
“Eterno presidente”, jogador, capitão e técnico. Assim se resume a participação de Nobre no seu (literalmente) time. Questionado em tom provocador pela reportagem se seria uma espécie de Juvenal Juvêncio do Palmeirinha, em alusão ao estilo centralizador do presidente do São Paulo, apenas riu. – Isso é você quem está dizendo.

Distante de seu hobby, Nobre carrega a tatuagem de um porquinho de braços cruzados em sua canela. É o símbolo do time. Mas orgulho mesmo ele tem de um dos atuais jogadores do Palmeirinha: Evair.
O maior ídolo de Nobre, até então, só havia ido à sua casa em formato de pôster. A comemoração de seu gol contra o Corinthians, na final do Paulistão de 1993 que encerrou um período de 17 anos sem títulos, está retratada em cinco metros. Quando Evair, em pessoa, visitou Nobre pela primeira vez, ele não estava.
– Fizeram uma surpresa pra mim no dia de uma reunião do Conselho no Palmeiras. Fiquei p...!
 
Quando surgiu o Alviverde...

Hoje, Paulo Nobre preside o Palmeiras, filiado à Federação Paulista de Futebol, comandada por Marco Polo Del Nero. Mas a relação entre eles é antiga. Paulo foi colega de classe de sua filha Carla, e, num clube da Granja Viana, bairro de São Paulo, jogou bola no mesmo time de seu filho Marquinhos. Marco Polo era o técnico. Em 83, já influente no Palmeiras, o atual presidente da FPF deu a Nobre uma ficha de sócio do clube.

O gesto começou a mudar a cabeça do rapaz. Aos poucos, ele sonhava menos em ser jogador e mais em ser presidente. Pensamento que se fortaleceu numa viagem aos Estados Unidos, em 1992, pouco depois de o clube assinar parceria com a Parmalat e dar início ao período mais vitorioso de sua história.
– Consegui uma camisa do novo patrocínio e fui ver um jogo da Seleção. De repente vejo um cara também com a camisa. Como será que ele conseguiu se foi tão difícil para mim? Conversamos, ele me disse que o César levou para ele. O César era o César Sampaio, e ele era filho do Carlos Facchina, presidente do Palmeiras.
Em 97, Facchina ajudou Nobre a se posicionar em uma chapa para concorrer a uma vaga no Conselho. Aos 29 anos, depois de estudar a política do clube e buscar votos entre sócios que não frequentavam o Palmeiras, pois os mais presentes já estavam ligados a conselheiros antigos, ele se elegeu com 29 votos. Repetiu a dose em 2001 e 2005, até ser eleito vice-presidente e se tornar vitalício em 2007.

Por - São Paulo