BLOG DO BETO

sábado, 7 de maio de 2016

O “novo” Muricy não pode abrir mão do passado.

Há dois momentos na vida em que o ser humano sente vontade de romper com tudo e mudar radicalmente de vida. A primeira é no começo da fase adulta, quando o ex-adolescente quer mudar tudo e tenta sair para conhecer e conquistar o mundo. O segundo período é por volta dos 50 anos, quando, depois de se dedicar anos a outras pessoas e já com certo sucesso pessoal, vê espaço para um mudança radical na esperança realizar tudo que não pode fazer durante o período mais produtivo da sua vida.

Os resultados são distintos. Na primeira fase de “rebeldia” as experiências e tombos vividos servem como aprendizado e vão dar um norte para o que a pessoa quer realmente da vida. Já as mudanças na chamada fase da maturidade só vão ter realmente resultado, se tudo que a pessoa tenha adquirido de conhecimento e experimento na vida não seja esquecido. Depois de maduro ninguém vai ter sucesso em um novo caminho se querer começar do zero e querer apgar tudo que realizou.

Gastei os dois parágrafos iniciais deste post para tentar explicar o atual momento do técnico Muricy Ramalho. É louvável sua intenção de mudar seu pensamento de como armar times, mas ele só vai ter sucesso se não se esquecer tudo que o fez para se tornar um dos técnicos mais vitoriosos do país.

Se o atual treinador do Flamengo abrir mão dos conceitos que o transformaram em dos profissionais mais respeitados – e bem pagos – do mercado, ele seguramente não vai acreditar – e muito menos passar para os atletas – no novo modo que ele quer que suas equipes atuem. E é isso que está acontecendo no seu trabalho que já tem cinco meses de Flamengo.

O time da Gávea hoje é uma bagunça e desorganizado, o que reflete a mudança repentina do comportamento do treinador que de uma hora para a outra passou de “quer ver espetáculo vai ao teatro” para “o futebol mudou e quer a equipe que ele treina tenha o espírito do Barcelona - dentro e fora de campo”.

Não vou falar da qualidade do elenco do Flamengo que é, como de quase todos os principais times brasileiras do momento, de mediana para baixo, pois estou falando do treinador.

E ele como comandante tem a obrigação de tirar o máximo dos seus atletas, o que não está acontecendo, nem quando o time teve longos períodos de treinos para se preparar, como aconteceu no período entre a eliminação do Campeonato Carioca até a partida contra o Fortaleza.

Aliás, falando em qualidade de elencos, Muricy Ramalho foi campeão com times sem grandes estrelas e jogadores. Até no seu trabalho mais vitorioso no São Paulo, que resultou na conquista “apenas” de três Campeonatos Brasileiros – 2006/07/08 - consecutivos ele não teve a disposição uma seleção nas mãos, que teve sempre mudanças de um ano para o outro. Não foram poucas as vezes que o treinador declarou que o único craque do time era o goleiro, no caso Rogério Ceni.

Para conquistar o tricampeonato do Nacional, Muricy Ramalho montou um dos times mais eficientes da história do nosso futebol. Um time muito difícil de enfrentar, que atuava de maneira compacta, ditava o ritmo do jogo, não deixava o adversário jogar e que tomava poucos gols.

Naqueles três anos, quando o São Paulo abria o placar era muito difícil o adversário ter a chance de empatar o jogo, quanto menos ficar esperançoso de virar o jogo. Também o treinador tinha variações táticas dentro da partida, o 3-5-2 utilizado virava um 4-4-2 com um zagueiro se transformando em lateral, ou até no ofensivo 3-4-3.

Ou seja, tudo que o “novo” Muricy e também a torcida do Flamengo gostaria de ver no time atualmente e que são conceitos de futebol moderno até hoje.

(Uma pena que boa parte de torcedores e imprensa também esquecem como aqueles times eram bom e criaram até o adjetivo “Muribol” para classificar um time que fazia muitos gols de cabeça e em jogadas de bolas paradas, que é uma tendência até hoje dos nossos times.)

Ainda teve mais um título do Brasileiro com o Fluminense de 2010, depois de perder um título ganho com o Palmeiras em 2009 e o da Copa Libertadores de 2011, quando ele assumiu o time no meio da disputa e acertou time defensivamente e conseguiu aproveitar o talento de Neymar.

Cabe ao Barcelona um grande papel na tentativa de mudança total dos conceitos de Muricy.

O primeiro ato foi na final do Mundial de Clubes, em 2011, quando o Santos, treinado por Muricy, não viu a bola na decisão que foi contra o time espanhol. O passeio foi tão grande, que o placar de 4 a 0 para os europeus foi classificado como uma aula de futebol por alguns jogadores santistas.

Já no ano passado, o técnico sem trabalhar e longe dos problemas de saúde que o incomodaram durante um bom tempo, ficou vários dias no Barcelona e ficou encantado com que viu. Passando pela parte diretiva e estrutura do clube, pelo processo na formação de jogadores e pelos treinos do time.

O “novo” Muricy Ramalho só vai surgir realmente quando recuperar sua essência e a juntar com os novos conceitos. Se continuar apostando em uma mudança radical, como está tentando, o treinador não vai conseguir ter resultados e vai virar um treinador que tem um discurso bonito – ou de “conversinha”, outro termo que o técnico utilizava nos seus tempos vitoriosos – que não consegue aplicar a teoria na formação de um time que consiga bom desempenho – e também resultados.

por Humberto Luiz Peron